segunda-feira, 30 de novembro de 2020

Poema da Noite

Voltei  para este lugar,
Onde espero passar os meus últimos momentos.
Eu que sempre esperei pelo fim,
Sempre o ansiei sem nunca o antecipar.
Vivo o fim como um receio novo e inédito a que meu corpo se acostuma
Como a luz ao acordar.
Vivo este último espaço de tempo esperando o derradeiro verão,
Mesmo sabendo que já não há sol que aqueça a minha pele
Nem vento que encontre meu cabelo
Nem pensamento novo que me assuste.
Eu que me repito muito, 
Que escrevo pouco,
Sobre nada.
Eu que me encontro esgotado
Sem ter realizado algo.
Sou só esta sombra que espera
Pela noite para desaparecer.
Eu que estou a morrer.

terça-feira, 29 de maio de 2018

Um bocejo

Escuta! O silêncio, a melodia da minha preexistência.

A imagem reflectida num lago é sempre mais bela que a real. Há uma leveza que vem da sua inexistência, que a torna bela.

Acordo sem saber de onde vem a luz. Espreguiço-me e a estranheza desvanece-se, e já não há diferenças que identifique depois do bocejo matinal. Ainda que as ruas cheirem diferente, ainda que o som das avenidas seja estranho, mesmo com todas as peculiaridades sinto que já vi toda esta gente. Não há pessoa que não identifique pelo andar, pelo falar. Conheço os a todos, antecipo todos os seus movimentos. Nada que façam me surpreende. Minha cara pode mostrar o contrário, mas é puro teatro. Em mim não há sentimento ou emoção que não seja artificial. Todas as conversas, todos os movimentos, são meticulosamente estudados previamente. Não há em mim qualquer espontaneidade (para além daquele bocejo matinal). Não há dia que já não tenha vivido. Não há conversa que já não tenha ouvido. Não há cor que não tenha visto. Acordo já cansado. É apenas aquele momento antes de acordar, o momento ulterior ao sonho, que minha mente estranha.

Que triste manhã a de hoje. As avenidas cheias de uma massa indistinta de gente que corre como um rio de lama que arrasta consigo minhas ilusões. Eu rastejo na sombra sibilando para afastar o tédio. E deixo na avenida um rasto de escamas que perco sem saudade.

Que vontade em atirar me para a estrada movimentada e fazer da minha existência um linha do obituário local. Sempre era mais que duas datas numa mármore fria.

27/12/2017, Hamburgo

sábado, 14 de outubro de 2017

No fim...

E se no fim não tiver alcançado nada? E se no fim só contar falhanços? E se no fim não restar em mim outro sentimento que o arrependimento? E se no fim me aperceber que nunca fui quem supus ser? Que a imagem mais viável de mim era aquela que reflectia nas águas sujas de um pântano. Que importa isso quando vivi sempre nas sombras.

Eu que nasci com esta estranha e contraditória condição que me impossibilita simplesmente de viver. Eu que tantas vezes tive de lembrar meu coração para continuar a bater. Que a cada acordar era com quem mergulhava num rio profundo sem margens. E se no fim não tiver o fôlego para voltar à superfície da vida e respirar? E sempre que o sol nasce expõe minha natureza e eu, qual criatura estranha num deserto aberto, tento desesperadamente esconder me da luz que cega a realidade.

Com o tempo fiquei apático, minha alma embalsemada num corpo vivo, meus sonhos amputados sem anestesia, meus medos cicatrizes de feridas antigas.

Não fiz outra coisa na vida que não desperdiçar tempo, da forma mais fútil e inútil, que é a única maneira que há de viver. E se no fim ainda me restar tempo para desperdiçar? E se no fim este dia não terminar? se a fresca noite não chegar? se não houver trevas onde me possa deitar e respirar, onde possa simplesmente desvanecer e na manhã seguinte ser impossível provar que alguma vez existi.

E se no fim tudo isto for verdade? Que diferença faz, eu que sempre vivi nas sombras, e mesmo que não vivesse? Que diferença faz? Que diferença faz quando nem o local onde se será enterrado se pode escolher? Que me importa isso, que me importa se ninguém chorar nesse dia?

sexta-feira, 17 de junho de 2016

Birthday

First of all I want to thank Oksana and Dan Thanks to invite me to my birthday (smiling). Then thank you all to come to celebrate with us (you could be doing something more interesting than celebrate the birthday of someone you barely know (laughing)). Thank you.

This is my first birthday celebration in 10 years. In these 10 years I never found any reason to celebrate. I don't know why. Maybe because I am far from family and friends.  When June comes doesn't matter how blue is the sky and how warm is the weather I feel always dark and cold.

These two years in Sheffield hasbeen a lovely surprise. Despite the weather and the lack of colour, Sheffield is indeed an unique city, mostly due to the people. I met in Sheffield unique people as Dan, Oksana, Paco, Chris and so many others. It was the first time in my life I met people living without fear, who enjoys the life with very simple things, as this small celebration. People who lives an eternal life right now.

They shown me that there is a solution for my fear and my existential problem, but one thing is to know that there is a solution the other much more difficult is to get it. Dan would say I keep on top of the fence and he is right. I sabotage all ways to get God, maybe because in this way I still have an excuse to sin and at same time I keep running my own life. If this is the case, the price is huge. An each year I feel more and more distant, as if my soul and body were vanishing. Yes a dead body doesn't have reasons to celebrate birthdays.

But If I am here right now with you is because Jesus, the same whom I don't believe, how ironic is it? I don't know how long I will keep ignoring his knock. I just hope that not be too late.

Well i am 28 years old and I feel lost and lonely. But today, even with this gray sky and this soft summer, I feel something. I just need to look the Zoe smile and I feel the entire universe touching my heart.

Well better end this speech before I start to cry. They say that the age is just a number, but the problem is that as physicist I take numbers very seriously (laughing). And this will be probabily my last year in this unique city. I miss you already.

With love



sexta-feira, 25 de abril de 2014

O Último

Hoje acordei estremunhado, talvez um pesadelo, talvez um sonho. Sonhar tem sido tão raro na minha vida, talvez não tenha suportado a ideia de beleza e tenha despertado para este mundo que me reflecte na escuridão. Lavei a cara para despertar e no espelho vi o mesmo desconhecido que habita em minha mente. Mudara-se para cá quando deixei minha casa de infância, ou talvez tenha sido eu quem chegou depois.

A vontade de ir trabalha é nenhuma. Já estou atrasado, levarei uma reprimenda do chefe de serviço, a qual ouvirei sem protestar. Protestar é mais uma das coisas que já não faço. Já não há por que lutar. Tudo me é tão indiferente quanto eu sou indiferente a tudo. A única reacção que as coisas me provocam é um longo e demorado bocejo que faço por evitar enquanto oiço o sermão.

É ali naquele meu cubico, onde faço trabalho administrativo que aborreceria muita gente, mas que confesso o faço até com alguma satisfação, mas é ali, rodeado dos meus sonoros e estridentes colegas de trabalho que têm sempre as emoções espelhadas no rosto, que têm sempre algo para dizer, que se admiram com as coisas banais da vida, que se entusiasmam com quase nada, é ali junto deles que me anulo. Ali não sou nada. Uma mera peça de uma maquina fria e insensível. E os olhares atravessam me como mais uma porção de ar no caminho de alguém.

Sou frequentemente o ultimo a sair do trabalho, o chefe dera me a "honrosa" tarefa de fechar a sala, talvez para premiar a minha "assiduidade". Sendo o último, é do penúltimo de quem oiço um "Adeus".

sexta-feira, 18 de abril de 2014

Conto do Homem Só

Oh homem só quem és tu? Quem és tu que ninguém sabe quem és, ninguém te conhece, nem a ti nem aos teus pais, irmãos ou amigos. Quem és tu que ninguém te conhece o passado, onde nasceste onde cresceste, onde e com quem viveste. Quem és tu que ninguém sabe dizer onde estavas e o que fazias na noite anterior, na hora anterior ou mesmo o segundo anterior. Quem és tu que toda a gente te vendo não existes para nenhuma dessas pessoas.

E no entanto não evito olhar para ti quando passas na avenida, andas sem pressa a um ritmo constante, numa linha rigorosamente recta, olhando em frente mas vendo muito para lá do horizonte. Ah esse olhar, podera eu descreve-lo e redefiniria o conceito de beleza. Não é a cor, nem o tamanho nem a forma, é a luz, uma luz negra em que tudo penetra, são olhos que vêm outro mundo, um onde a existência é plena e solitária, como aparentemente és tu.

Afinal para onde vais? Que lugar é esse onde encontraste a vida? Porque não revelas o teu segredo? Já eu não tenho onde ir. Entretenho me a sonhar com a vida que passa pela rua como tu, sem origem e indiferente a mim. Que faço aqui, sentado nesta esplanada no meio da avenida vendo as pessoas passar? Que faço à noite acordado quando toda a gente já está a dormir? Porque penso tanto na vida em vez de a viver.

Amanhã vou chegar atrasado ao trabalho, vou ficar na cama a imaginar que sei quem sou.