sábado, 14 de outubro de 2017

No fim...

E se no fim não tiver alcançado nada? E se no fim só contar falhanços? E se no fim não restar em mim outro sentimento que o arrependimento? E se no fim me aperceber que nunca fui quem supus ser? Que a imagem mais viável de mim era aquela que reflectia nas águas sujas de um pântano. Que importa isso quando vivi sempre nas sombras.

Eu que nasci com esta estranha e contraditória condição que me impossibilita simplesmente de viver. Eu que tantas vezes tive de lembrar meu coração para continuar a bater. Que a cada acordar era com quem mergulhava num rio profundo sem margens. E se no fim não tiver o fôlego para voltar à superfície da vida e respirar? E sempre que o sol nasce expõe minha natureza e eu, qual criatura estranha num deserto aberto, tento desesperadamente esconder me da luz que cega a realidade.

Com o tempo fiquei apático, minha alma embalsemada num corpo vivo, meus sonhos amputados sem anestesia, meus medos cicatrizes de feridas antigas.

Não fiz outra coisa na vida que não desperdiçar tempo, da forma mais fútil e inútil, que é a única maneira que há de viver. E se no fim ainda me restar tempo para desperdiçar? E se no fim este dia não terminar? se a fresca noite não chegar? se não houver trevas onde me possa deitar e respirar, onde possa simplesmente desvanecer e na manhã seguinte ser impossível provar que alguma vez existi.

E se no fim tudo isto for verdade? Que diferença faz, eu que sempre vivi nas sombras, e mesmo que não vivesse? Que diferença faz? Que diferença faz quando nem o local onde se será enterrado se pode escolher? Que me importa isso, que me importa se ninguém chorar nesse dia?

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